Gravidez na adolescência

A adolescência é, por si só, um período complexo de alterações físicas e psicológicas. A ocorrência de uma gravidez precoce, e eventual maternidade, traz implicações que importa analisar para que se evitem situações semelhantes ou se atenuem as consequências negativas que daí podem advir para a jovem mãe e não só.

Das conclusões do estudo “Aventura Social & Saúde: A Saúde dos Adolescentes Portugueses. Relatório do Estudo HBSC 2010”, coordenado por Margarida Gaspar de Matos (amostra composta por 5050 adolescentes, com uma média de idades de 14 anos), importa salientar que:

  • A maioria dos adolescentes refere nunca ter tido relações sexuais
  • Verifica-se uma diminuição ligeira no número de adolescentes que refere já ter tido relações sexuais desde 2002 (de 23,7% para 21,8%)
  • Os jovens têm a crença de que cerca de 4 em cada 10 dos seus colegas já teve relações sexuais (na realidade são 2 em cada 10)
  • A maioria dos que já tiveram relações sexuais usou preservativo na última relação sexual
  • O uso de preservativo aumentou desde 2002 (de 71,8% para 82,5%)
  • Os adolescentes revelam algum desconhecimento face a temas de saúde sexual e reprodutiva e alguma ineficácia pessoal a nível das atitudes – comunicar e negociar as relações sexuais com preservativo e embaraço na aquisição e porte de preservativos
  • Os adolescentes têm atitudes cada vez mais liberais e com mais frequência se atribuem o direito de ter relações sexuais
  • Um número importante de adolescentes acedem cada vez mais rapidamente às relações sexuais coitais
  • Os que têm relações sexuais coitais fazem-no com maior número de parceiros
  • Saltam-se mais etapas intermédias ou estas duram menos tempo
  • A diferença entre géneros em termos de atitudes e condutas são cada vez menores

Segundo a bibliografia especializada, destacam-se como fatores de risco pessoais:

  • Adolescentes que vivem em situações desfavorecidas do ponto de vista social, económico, pessoal e cultural – pobreza, baixos níveis educacionais, exclusão do sistema de ensino e do emprego (Coley & Chase-Lansdale, 1998; Figueiredo et al., 2006; Figueiredo, Pacheco, & Magarinho, 2004, 2005)
  • Ambientes familiares caracterizados por stress, pressão e conflitos, apresentando deste modo maior disfuncionalidade e rigidez (Lourenço, 1998)
  • Condições desenvolvimentais adversas na sua história de vida (Figueiredo et al., 2004)
  • Início da vida sexual e o envolvimento em relações sexuais sem utilização eficaz de contraceptivos
  • Abandono escolar/má relação com a escola

Dados e factos

A diminuição de gestações e nascimentos em mães adolescentes acompanha o declínio (ver PORDATA) que se observa desde a 3a década do século XX, dos índices de fecundidade e natalidade na população em geral (United Nations Statistics Division, 2008), devendo-se a:

  • Maior escolarização
  • Aumento da idade de entrada na conjugalidade
  • Maior investimento e disponibilidade de informação na área da Educação Sexual
  • Acesso mais facilitado a métodos contraceptivos
  • Aumento do conhecimento dos riscos associados a Infeções Sexualmente Transmissíveis
  • Maior recurso ao aborto

(Canavarro & Pereira, 2001; Lalanda, 2004; Miller, Bayley, Christensen, Leavitt, & Coyl, 2003; Pereira, 2001; Piccinino & Mosher, 1998).

Apesar da maternidade adolescente estar a diminuir em Portugal, continua a ser um problema, na medida em que existem consequências negativas aos níveis psicológico, biológico, social, educativo e económico, principalmente associadas à rapariga grávida ou mãe, mas também ao pai da criança, à família de origem de ambos, ao bebé, e, até, à sociedade. Estas consequências são na verdade mais significativas se considerarmos os/as jovens provenientes de meios de pobreza ou pobreza, onde co-existem já vulnerabilidades acrescidas aos níveis referidos. Assim, o percurso para a inclusão social destas jovens e suas famílias é um desafio político e estratégico para o futuro e de cidadania no quotidiano.

Impacto

Consequências da gravidez/parentalidade precoce para a jovem

  • No que respeira ao risco obstétrico, para a saúde da mãe e do bebé, os fatores biológicos seriam importantes apenas no caso das adolescentes mais jovens (menores de 15 anos), devido a maior imaturidade física e reprodutiva (Klein, 2005); Nas outras situações, piores resultados a nível obstétrico e neonatal poderiam ser explicados mais pelos fatores socioeconómicos (Harris & Allgood, 2009). Existe um risco aumentado em caso de vigilância pré-natal tardia
  • Elevadas taxas de abandono escolar, baixos níveis de instrução, empregos menos qualificados e menores índices de satisfação profissional nas mães adolescentes, associados, habitualmente, a um contexto de vida de maior pobreza e precariedade, num ciclo que se auto-perpetua (Canavarro & Pereira, 2001; Figueiredo, 2000a, 2000b; Figueiredo et al., 2006; Sieger & Renk, 2007). Apesar de as adolescentes com história de gravidez e maternidade experimentarem maior insucesso escolar, grande parte delas abandona o sistema de ensino antes de engravidar (cf. Araújo Pedrosa, 2009)
  • A perturbação emocional e os índices de stress evidenciados pelas mães adolescentes aparecem com frequência associados, entre outras variáveis, a falta de apoio, criticismo e rejeição por parte dos próprios progenitores; falta de apoio por parte do pai do bebé; e situações de violência emocional e física na relação amorosa (Larson, 2004; Milan et al., 2004; Passino et al., 1993; Sussex & Corcoran, 2005)
  • A relação com o pai da criança pode ser um fator de risco ou de proteção para a adaptação à maternidade adolescente. Embora sensivelmente metade dos casais em que pelo menos a mãe é adolescente continuem juntos nos primeiros meses após o nascimento do bebé, esse número vai decrescendo ao longo do tempo (Cox & Bithoney, 1995; Rhein et al., 1997)
  • As jovens vivem mais anos sozinhas, normalmente enredadas em ambientes de maior instabilidade conjugal e maior possibilidade de divórcio (Bennett, Bloom & Miller, 1995; Hotz et al., 1997a, 1997b)
  • Maior probabilidade do que as mulheres que se tornam mães em idade mais tardia de vir a depender de subsídios sociais (Holtz, McElroy, & Sanders, 1997a, 1997b), o que contribuirá para perpetuar o ciclo de exclusão e precariedade social, agravando os problemas socioeconómicos anteriores (Baker et al., 2007; Geraldes & Araújo, 1998; Pereira, 2001)
  • Risco de repetição da gravidez precoce: a probabilidade de estas jovens terem um segundo filho ainda enquanto adolescentes é elevada: 30% das adolescentes que engravidam tem um segundo filho até dois anos após o nascimento do primeiro (Raneri & Wiemann, 2007); baixas habilitações escolares, competências cognitivas, ajustamento emocional, consumo de substâncias ou outros comportamentos de risco, exposição a situações de violência ou abuso físico ou sexual (Raneri & Wiemann, 2007)

Consequências para o pai da criança

O pai da criança é afetado pelas mesmas consequências psicológicas, sociais, educativas e económicas do que a mãe, quando se implica na gravidez/paternidade.

Consequências para o bebé/criança

Maiores dificuldades no seu percurso escolar, problemas de adaptação e risco de atraso desenvolvimental (Furstenberg, Brooks-Gunn & Morgan, 1987; Pogarsky, Thornberry, & Lizotte, 2006). O percurso escolar dos filhos de mães adolescentes é, com maior frequência, marcado por pior desempenho, mais insucesso e maior risco de abandono precoce do sistema de ensino, mais uma vez quando comparado com o percurso de filhos de mães mais velhas (Haveman, Wolfe, & Peterson, 1997; Maynard, 1996).

Apesar disso, condições como a maior escolarização da mãe ou circunstâncias de vida mais favoráveis, bem como a rede de suporte disponível para a família, entre outros, são determinantes para os resultados conseguidos (Luster & Bates, 2002; Luster, Bates, Fitzgerald, & Vandenbelt, 2000).

Estão posteriormente em maior risco de se envolverem em comportamentos de risco, como consumo de substâncias, actividade sexual precoce e parentalidade adolescente, continuando a evidenciar problemas comportamentais e cognitivos, perpetuando assim ciclos de carência e desfavorecimento (Hardy et al., 1997)

Consequências para as famílias de origem

Quanto às famílias de origem é comum que também sofram com esta situação. Para os pais há uma rutura das expetativas de futuro, um maior risco de stress, os conflitos familiares aumentam, bem como os problemas económicos e estão também sujeitos a uma rejeição social.

Fatores passíveis de contribuir para a qualidade do ajustamento à gravidez/parentalidade precoces

  • Personalidade prévia da grávida, as suas estratégias de coping, os sentimentos e reacções face ao bebé, a percepção de apoio social, o NSE, a raça e a idade da jovem, ficando visível a influência de características não só individuais, como relacionais e sociais, bem como a necessidade de ter em conta as várias ecologias de vida destas jovens (Soares e colaboradores, 2001)
  • Mães adolescentes provenientes de ambientes familiares mais estáveis e menos desfavorecidos, com maior apoio emocional e financeiro, por exemplo, apresentam uma taxa mais elevada de regresso à escola e de sucesso académico, comparativamente com as mães adolescentes oriundas de famílias desestruturadas (Corbett & Meyer, citado em Canavarro & Pereira, 2001)
  • Uma boa rede de apoio social parece ter uma acção protectora dos riscos associados à maternidade na adolescência, diminuindo a ansiedade associada à própria gravidez e ao desempenho das tarefas parentais, e promovendo níveis mais elevados de responsividade, sensibilidade e expressão de afecto da adolescente relativamente ao seu filho (Soares e colaboradores, 2001 e Soares e Jongenelen, 1998)
  • Suporte institucional: determinantes para a adaptação, inserção e consequências futuras experimentadas por estas jovens e os seus filhos.

Referências

Se és adolescente e suspeitas de uma gravidez, estás grávida ou és mãe/pai e queres conhecer os recursos existentes, clica aqui.

Lista de docs de referência

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